Processo
EREsp 1896456 / SP
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL
2020/0245182-0
Relator
Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (1123)
Órgão Julgador
S2 – SEGUNDA SEÇÃO
Data do Julgamento
12/02/2025
Data da Publicação/Fonte
DJEN 21/02/2025
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO
ESPECIAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. DOAÇÃO DE IMÓVEL ENTRE ASCENDENTE E
DESCENDENTE. CONTEXTO DE BLINDAGEM PATRIMONIAL. CARACTERIZAÇÃO DE
MÁ-FÉ DO DOADOR. DISPENSA DO REGISTRO DE PENHORA. CONFIGURAÇÃO DE
FRAUDE. EMBARGOS PROVIDOS.
I. CASO EM EXAME
- Embargos de divergência interpostos contra acórdão da Terceira
Turma do STJ que, aplicando a Súmula n. 375 do STJ, considerou
inexistente a fraude à execução em doação de imóvel realizada entre
ascendente e descendentes, devido à ausência de registro prévio da
penhora. O embargante aponta dissídio jurisprudencial com
entendimento da Quarta Turma, que dispensa o registro da penhora ao
reconhecer má-fé do devedor em contexto de blindagem patrimonial.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO - Há duas questões centrais em discussão: (i) se, para o
reconhecimento de fraude à execução, é indispensável o registro da
penhora na matrícula do imóvel, conforme a Súmula n. 375 do STJ;
(ii) se a doação de imóvel realizada por devedor em contexto de
blindagem patrimonial entre ascendentes e descendentes pode ensejar
a caracterização de má-fé, dispensando o registro da penhora.
III. RAZÕES DE DECIDIR - A Súmula n. 375 do STJ estabelece que o reconhecimento da fraude
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à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da
prova de má-fé do terceiro adquirente. - Entretanto, a jurisprudência do STJ admite a relativização da
Súmula n. 375 do STJ em casos de doações realizadas no âmbito
familiar, quando a transferência de bens revela evidente tentativa
de blindagem patrimonial com o propósito de frustrar credores. - Em tais casos, a caracterização de má-fé decorre do vínculo
familiar entre o devedor e o donatário e do contexto fático, como o
conhecimento da pendência de demandas judiciais e a permanência do
bem no núcleo familiar, ainda que sem registro prévio da penhora. - No caso concreto, a doação foi realizada pela executada em favor
de seus filhos, com reserva de usufruto, após decisão que
desconsiderou a personalidade jurídica da empresa familiar
dissolvida irregularmente, em contexto de insolvência. - As circunstâncias demonstram inequívoca intenção de blindagem
patrimonial, configurando fraude à execução, independentemente da
ausência de registro da penhora. - A uniformização da jurisprudência interna do STJ, ao alinhar-se à
interpretação da Quarta Turma, assegura maior previsibilidade e
proteção aos princípios da execução, como a boa-fé objetiva e a
efetividade no cumprimento das obrigações.
IV. DISPOSITIVO E TESE - Embargos de divergência providos.
Tese de julgamento: O registro da penhora na matrícula do imóvel é
dispensável para o reconhecimento de fraude à execução em hipóteses
de doação entre ascendentes e descendentes que configure blindagem
patrimonial em detrimento de credores. A carcaterização de má-fé em
doações familiares pode decorrer do vínculo familiar e do contexto
fático que demonstre a intenção de frustrar a execução.
Dispositivos relevantes citados: CPC/1973, art. 593, II; CPC/2015,
art. 792, IV.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 1600111/SP, relatora
Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/9/2016; STJ,
AgInt no AREsp n. 1413941/MT, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta
Turma, julgado em 11/4/2019; STJ, REsp n. 1981646/SP, relatora
Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 2/8/2022.
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Seção, por unanimidade, dar
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provimento aos embargos de divergência, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Humberto Martins, Raul Araújo, Maria Isabel
Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Moura Ribeiro, Carlos Cini
Marchionatti (Desembargador Convocado TJRS) e Nancy Andrighi votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
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Fonte: STJ